NEM TODO REI TEM REINADO
Paulo Robson de Souza
I
Andei uns tempos pensando
No porquê dos animais.
Mesmo que não haja dúvida,
Perguntar nunca é demais:
— O que seria dos bichos
Se não fossem os vegetais?
Animal tem atitude,
Animal faz umas gracinhas,
Faz dengo, caras e bocas,
Dá medo, nos faz cosquinha...
Está sempre na “telona”
E muito mais na “telinha”.
Animal dá mais ibope
Nos programas de TV
Dá movimento ao cinema
Faz a gente se entreter.
Mas todo bicho depende
Das plantas para viver.
Sem o cacto no deserto,
Sem o tronco no cerrado,
Sem a mata a proteger
Bicho peludo ou penado,
Nenhum vai sobreviver:
O nambu fica pelado,
Figura A9 – Cacto também é poesia (Fonte: J. Rosito, 2010)
A araponga vira um sino
Que diz “tou to-do...fer-ra-do”
A preguiça é presa fácil
Urutau é encontrado
O mico-leão é presa –
Saboroso alvo dourado.
Mesmo estando em campo aberto
O capim disfarça bem
O tatu, a seriema,
Tantos outros – mais de cem.
No cerrado até a onça
Tem a cor que lhe convém.
Milhares de animais
Usam a madeira caída
Para botar os seus ovos
Ou para curar feridas.
O que aparenta estar morto,
Vive “assim”, cheio de vida!
(...)
II
(...)
Não soubesse o vegetal
Dar sustento aos lambaris
Não haveria desovas,
O sauá, o apaiari,
Um festival de piranhas,
A traíra e o surubi.
(ABRO AQUI GRANDE PARÊNTESIS;
Até certos minerais
Deixariam de existir:
O carvão de pedra, mais
A turfa e a rocha grafite
Que do chão velho se extraem
São fósseis de antigas plantas
De milhões de anos atrás.
-mesmo o ar que inspiramos
Era muito diferente
No planeta primitivo
Coberto de lava quente.
Das primeiras algas veio
O oxigênio da gente!
-Muitas vezes a paisagem
É a obra acabada
De mil anos de labor
Da matéria vegetada.
Todo um morro construído
Por plantas acumuladas!
(...)
-Antes de Einstein descobrir
Que energia dá matéria,
Os vegetais já sab iam
Fazer coisas bem mais sérias:
Transformar luz em comida,
Diminuindo a miséria.
Quando a luz se faz matéria –
A glicose acumulada
Por meio da fotossíntese
Nas sedes clorofiladas –
É que foi possível ter
O reino da bicharada.
Figura A10 – Folhas, as sedes clorofiladas (Fonte: J. Rosito, 2010)
As plantas deixam seu rastro
Na comida do leão
Pois o reles gás carbônico
Que sai da respiração
No verdor da clorofila
Sofre uma transformação.
E seu átomo de carbono
Com a energia solar
Compõe a doce glicose
Que depois se ajuntará
Para formar o amido,
Que outro produto será.
Ao comer o vegetal,
Preás, ratos, ruminantes
Reconstroem, com o carbono,
Tecidos energizantes
E os que irão construir
Fortes corpos ambulantes.
(...)
Enfim, todo ser vivente
Deixa um rastro vegetal:
O carbono é o tijolo
Da pirâmide vital.
Há um hálito de planta
No “rei” do mundo animal
Que devolve para o mundo
Seu carbono corporal
Quando, satisfeito, expira...
E no suspiro final.
-Ah, se planta não soubesse
Transformar a luz solar
O vasto Reino Animal
Deixaria de se fartar...
-Nem sequer papel teria
Pra estes versos eu botar.
III
-Retomando o trilho, rumo
À questão inicial,
É preciso uma resposta
Para se ter o final.
- Mas não há fim nessa história:
Não há tristeza nem glória,
Pois não há Reino Animal,
Nem Monera, nem Protista,
Nem os reinos Fungi ou Plantae:
As bactérias adoram
A fresca sombra das plantas.
Para os fungos, os vegetais –
E, também, os animais –
São o seu almoço, sua janta.
(...)
Ninguém é rei de ninguém!
Há de findar os reinados.
Dá uma flor pra mim, tem dó
Desse poeta enrolado!
Dá em forma de sorriso
(Esse carinho preciso)
- Pra que eu me sinta agraciado neste verso
de pé quebrado.